terça-feira, 5 de agosto de 2014



Estamos participando de uma super postagem coletiva com outros blogs e o projeto é falar de filmes que foram adaptados de livros e três blogueiros se dividirem na postagem: um fala do filme, um fala da trilha sonora e um fala do livro. Infelizmente em relação a "Laranja Mecânica" não conseguimos ninguém para falar do livro, mas uma amiga minha, jornalista e que escreve super bem - Marina Brandão - quis falar do filme + sonora e eu abri esse espaço para ela aqui no blog! Se deliciem com uma postagem incrível sobre um filme melhor ainda!

“Tão estranho como uma laranja mecânica”. A expressão americana deu nome a um dos maiores clássicos do cinema, considerado uma verdadeira obra prima. Com um personagem profundo e um tanto quanto controverso, “Laranja Mecânica” revolucionou o cinema e chocou o público pela frieza com que trata temas como sexo e violência. Mas o longa de Stanley Kubrick vai muito além. Laranja Mecânica representa uma crítica à sociedade e ao Estado totalitário. 

Alex de Large (um sobrenome que foi criado para o filme, em uma referência a Alexandre, o Grande), é um adolescente violento e autoritário que gosta de sair à noite para praticar o que ele chama de “ultraviolência”. Sem empatia ou remorso, ele e seus amigos se divertem, até Alex ir preso e passar por uma experiência de condicionamento comportamental, associando violência a fortes enjoos e sentimentos ruins. Dessa forma, aquilo que há de mais natural (como uma laranja) passa a ser controlado por engrenagens, em sequências de atos completamente mecânicos. Nosso querido anti-herói transforma-se então em uma Laranja Mecânica.

A fórmula para o sucesso do filme está na combinação de um dos diretores mais estranhos do cinema, com a brilhante atuação de Malcom McDowell e uma trilha sonora clássica e sombria. 

A fotografia e a produção de Laranja Mecânica marcaram época. Como não se lembrar dos cílios postiços ou do chapéu coco utilizados por Alex? Mas, apesar desses ícones pops bem definidos, o filme é passado em um tempo e local indefinidos. O ambiente, com ares de futurístico, retoma o passado. E as referências a nomes russos (como o leite, “moloko”), o sotaque britânico e, até mesmo, o nome Alex, que é um nome sem sexo definido e sem regionalismos, poderia remontar a qualquer lugar. E a proposta é justamente essa: Alex é uma alegoria de todos nós. E Kubrick instiga nossa imaginação ao lembrar que em diferentes momentos podemos nos afastar ou nos aproximar do protagonista. 

Na verdade, o longa se revela um grande ballet: do início ao fim da trama, a trilha sonora – que parece contrariar as situações presentes no filme –, na realidade, reconfigura as cenas e transmite a percepção do protagonista sobre elas: com músicas leves e animadas, cenas de sexo não são sensuais, e cenas de violência não são violentas. Inclusive, Alex refere-se ao sexo como “o velho entra-e-sai”, pois, para ele não há sentimento envolvido em um ato estritamente mecânico. Assim, compreende-se que, como para Alex sexo e violência caminham juntos, essas cenas são belas e devem ser admiradas, ao contrário de repudiadas (como esperado pelo público). Para ele, a beleza dessas violências não passa de arte. Essa estratégia permite um distanciamento do espectador, que não necessariamente se sentirá constrangido diante de uma cena de estupro, por exemplo. 

E é justamente essa “falta de apelo sentimental” que dá o tom de estranhamento tão peculiar à obra do diretor. No caso de Laranja Mecânica, sua estética é levada ao extremo. O contraste da música clássica com o que se vê na tela cria uma cumplicidade entre espectador e anti-heróis, um efeito inesperado e que mostra que o potencial para a violência existe dentro de todos nós. Este, aliás, é um tema que perpassa toda a obra do diretor norte-americano. É preciso enfrentarmos nossos próprios demônios e admitirmos que o homem não é intrinsecamente bom.


Dessa forma, paradoxalmente, a música descontraída (acompanhada de cenas fortes), que revela o caráter “desumano” de Alex é a mesma música que expõe seu lado mais humano, devido ao seu apreço pela arte e, principalmente por Ludwig van Beethoven. 

Essa contradição traz à tona uma das reflexões que eu considero mais importantes do filme: será Alex desumano, ou seremos nós (espectadores) ao julgá-lo e rotulá-lo como psicopata de maneira tão rápida e sem maiores reflexões? Em uma grande crítica, desde o inicio da estória, Kubrick e Alex revelam como um Estado “movido em prol do bem maior” pode ele mesmo ser tornar tão violento e totalitário quanto à violência que dizia combater.

Para você, o que é mais desumano"

Veja os outros blogs que também estão participando dessa blogagem coletiva:

- Abduzidos por Palavras
- Café com Aroma de Livros
- Cine Opinativo
- Mutações Faiscantes da Porto
- Ouvi Por Aí


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